Em uma tentativa de golpe contra a terra de onde todos os anjos
nascem, meu pai selou um acordo com Lucinda, o arcanjo no comando de
Dreamland. A filha do meio do reino do céu com o filho mais velho da
terra das sombras.
Em uma fatídica tarde, Sophia e eu tivemos nosso primeiro
encontro na cachoeira próxima à vila. Quis levá-la até lá pois sabia que
ela apreciava o local, mas as tentativas de conquistá-la não foram
eficazes. Foi exatamente nesse momento que percebi que a doce jovem de
cabelos brancos não seria alguém fácil de se dobrar.
No entanto, ao contrário de qualquer pessoa que eu já tenha
conhecido, lhe surpreendeu saber de um fato banal de minha vida: às
escondidas de meu pai, que acha a prática inútil, eu pinto quadros.
Aproveitar-me da inocência e fascinação da moça foi meu instinto.
- Quer ser minha musa? - meu tom era sedutor, como costumo usar
com qualquer outra mulher.
Suas bochechas coraram a tal ponto que quase era possível sentir o
calor à distância.
- Não sei... Depende de como for.
- Tranquilize esse pequeno coração, pode usar um pano para se
cobrir - Meu sorriso de canto deixava clara a ironia, mas Sophia não
parecia ser adepta desse tipo de coisa.
- Calma... Pensei que pintaria um retrato. Eu... preciso pensar.
- Pense, mas eu não desperdiçaria essa oportunidade - Meus dedos
contornaram delicadamente seu maxilar. - Seus traços são lindos demais
para não serem registrados.
Nesse momento, o olhar de Sophia mudou. Ela claramente estava
intrigada, e talvez isso tenha lhe dado uma ponta de coragem.
- E quando gostaria de começar a pintar? - Sua voz era segura,
firme.
Bingo! Estava muito próximo do que queria. No entanto, o toque
final foi aparentar ser um bom moço.
- Quando estiver disponível.
Mal terminei de falar, e Sophia me interrompeu com sua voz
baixinha e ansiosa:
- Bem, ninguém precisa saber, hm? Teria algum lugar?
Meus olhos arregalaram com sua resposta, mas logo recuperei a
compostura.
- Meu ateliê fica a algumas milhas daqui, nada que não possamos ir
voando. E ninguém precisa saber, concordo.
Por ainda estar conhecendo suas habilidades de voo, Sophia não
conseguia se manter no ar por muito tempo, então não hesitei em
carregá-la em meu colo, deixando que minhas asas nos conduzissem acima da floresta que circunda Shadowland.
Aterrissei na parte de trás do castelo, conduzindo-a pela mão através de uma
porta discreta de madeira escura. Após alguns lances de escada,
finalmente estávamos no meu ateliê, que fica no subsolo. A luz
difusa do entardecer entrava pela janelinha pequena que dá para o pátio, trazendo um clima agradável ao
local.
- Bem vinda! - Meu tom era de um bom humor sincero.
Os olhos claros do jovem anjo passeavam pelo local, e ela parecia
sinceramente fascinada:
- Mesmo sombrio, é lindo aqui.
Peguei um elástico de cima de uma mesinha, prendendo meu cabelo
em um rabo frouxo e bagunçado. Com as mangas de minha blusa puxadas
até os cotovelos, arrumei o cavalete com uma das telas brancas que tinha
em um canto.
- Bem... Deixe-me ver... - nesse momento, minha postura
concentrada assumiu o controle.
Puxei um sofá antigo para frente da janela, assim os raios de sol
bateriam em suas costas, criando um belo efeito. Meu sorriso continha
certa malícia ao vê-la tão tímida.
- Fique à vontade.
- Bem, poderia me dar licença para eu me ajeitar? Eu realmente
preciso ficar nua? - seu tom era tímido, e em nada se parecia com a moça
que propôs ir até lá.
Pisquei para ela, sorrindo de canto:
- Tire suas próprias conclusões.
Fora do ateliê, dei tempo suficiente para que Sophia se arrumasse,
e ao ouvir sua voz abafada, retornei... Paralisando ainda na porta.
A visão daquela mulher parcialmente enrolada em um pano branco,
deitada no sofá em meu ateliê era literalmente angelical. Observei sua
pele onde estava exposta, e fiquei curioso sobre como devia ser a textura
dela, resmungando comigo mesmo:
- Parece tão macia...
Balancei a cabeça, me aproximando dela e agora a olhando de
forma mais artística. Delicadamente, puxei seu cabelo para frente,
deixando que se espalhasse pelo sofá. O sol da manhã fazia com que ele
cintilasse.
De início, minha intenção não era pintá-la de fato, mas fiquei tão
hipnotizado que dei alguns passos para trás, me posicionando atrás da
tela. Munido de pincel e paleta, comecei a pintar freneticamente, dando
atenção a cada mínimo detalhe daquele ser claramente sobre-humano à
minha frente.
O olhar de Sophia se mantinha no meu, e isso era ainda mais
tentador. Já havia pintado o esboço da parte superior de seu corpo, e
quando cheguei ao rosto, me permiti parar para observar seus traços. Baixei o pincel por alguns segundos, e a cor rosa em suas
bochechas me encantou tanto que já não pensava em pintar. No entanto,
usei isso como desculpa para me aproximar, largando os apetrechos sobre
a mesinha de canto e andando até minha musa.
Segurando seu queixo, minha voz saiu em um sussurro:
- Assim... Vai realçar seus traços.
E para nossa surpresa, acabei não a soltando, agora deixando que
meu olhar transmitisse toda a intensidade do sentimento que começava a
surgir ali. Seu olhar fixo em mim me acendeu imediatamente,
principalmente quando percebi a exata direção em que ela olhava: para
meus lábios.
Lentamente, me sentei no sofá, e percebi que Sophia também se
inclinava cuidadosamente, prendendo o pano em seu corpo. Por alguns
segundos, me limitei a não falar nada.
De forma premeditada, passei um dos braços em torno de seus
ombros enquanto meu rosto se aproximava do dela. Foi instintivo como
minha mão encontrou seu rosto, e as pontas dos dedos roçaram
levemente na bochecha enquanto o polegar contornava de forma
lenta seus lábios delicados. Sentir sua respiração ofegante em meu rosto
fez com que minha voz ficasse rouca pela faísca que parecia ter surgido:
- A textura da sua pele...
- Você... Não vai continuar a pintura? - a voz dela era tão baixa
quanto a minha.
- Depois... Shhhh!
Sem que Sophia se desse conta, deslizei uma de minhas mãos pela
sua coxa, amando a sensação da pele em meus dedos. A forma como a
trouxe para meu colo pode ter sido meio brusca, mas condizia com a
urgência do momento.
- Amaranth, eu estou sem roupa... por favor, me coloque no sofá de
novo - agora seu rosto todo estava em chamas.
Minha respiração ficou ofegante com a sua proximidade, e encostei
nossas testas, fechando os olhos.
- Não quero.
Minha mão passeou pelas costas expostas, e um gemido baixo
escapou involuntariamente debido à temperatura morna de sua pele contra
meus dedos um pouco frios. Com o corpo de Sophia totalmente preso a
mim, finalmente selei nossos lábios de forma demorada, estremecendo
com a sensação.
Me afastei apenas para olhar sua expressão angelical, e a forma
doce com que me fitava me fez grudar os lábios nos dela imediatamente,
dessa vez dando início a um beijo intenso, onde um se entregou ao outro
completamente, em uma sincronia perfeita.
Durante o beijo, ainda escutei sua recusa hesitante:
- Não podemos...
No entanto, não conseguia parar, e Sophia tampouco. Sentir sua
resposta positiva e entregue me levou a dar um puxãozinho que fez o
pano descer, deixando a parte superior de seu corpo totalmente nua, mas
antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, ela se cobriu novamente.
- Podemos sim - resmunguei.
Passei uma perna por cima de seu corpo, agora ainda mais quente,
apoiando meu joelho do outro lado. Seus pulsos estavam presos contra o
sofá quando colei meus lábios nos dela novamente, com vontade, dessa
vez deixando o beijo mais lento, o que fez meu corpo inteiro responder
com um calor fora do controle.
- Amaranth... - sua voz trêmula soava tão linda!
Me afastei, soltando o pulso que estava apoiado no assento do sofá
e olhando fixamente aquele rosto perfeitamente desenhado enquanto meu
indicador contornava o osso de sua clavícula, se aproximando cada vez
mais do pano. Foi nesse momento que Sophia colocou o ponto final.
- Não, não ouse. Eu... não quero.
Apesar de sua autoridade, meu tom ainda era persuasivo. Eu a
queria tanto!
- Não quer? Mesmo? Sua pele está tão quente...
- Por favor... Não. Na verdade, eu quero - ela parecia constrangida
por admitir seus desejos. - Por favor, ainda estamos nos conhecendo e
vamos... casar. Quero fazer as coisas com calma, Amaranth.
Bem, só me restou soltar um longo suspiro, e meu tom ainda era
sedutor quando a puxei para meu peito, deixando que o pano se
enroscasse entre nós:
- Saber e sentir que você me quer já basta... Por hoje.